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Copyright © 1999 Pedro Paulo A. C.Cunha. Todos os direitos reservados.
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"Olhe à direita
Duas raias !"
- "Positivo. Nade entre as pedras e as raias para eu bater uma foto."
Com certeza Jacques Cousteau sonhou em poder falar assim com seus mergulhadores quando filmou "O Mundo do Silêncio" há mais de 40 anos. O curioso é que desde o início do século é possível falar debaixo dágua, mas somente nos últimos anos a comunicação subaquática começou a se popularizar entre os mergulhadores amadores.
Os primeiros escafandros clássicos já eram dotados de um intercomunicador semelhante a um telefone. Embora esta tecnologia seja utilizada até hoje no mergulho profissional, ela nunca pode ser utilizada no mergulho amador autônomo por depender de um conjunto de fios ligando o mergulhador à superfície - você já imaginou vinte mergulhadores saltando de um barco no Caribe arrastando atrás de si centenas de metros de fios ?
Foram necessárias algumas décadas para que surgisse uma tecnologia que acabasse com o silêncio no mundo do mergulho amador. Era preciso desenvolver um equipamento que funcionasse sem fio, como um walkie-talkie submarino, uma tarefa aparentemente fácil se as ondas de rádio comuns se comportassem debaixo dágua da mesma forma que no ar. Infelizmente dentro dágua elas não se propagam por mais de alguns metros e são praticamente inúteis para comunicação entre mergulhadores.
Os
engenheiros encontraram a resposta para o problema quando perceberam que as ondas de
ultra-som se propagam excepcionalmente bem dentro dágua. O princípio de
funcionamento da maior parte dos equipamentos de comunicação subaquática sem fio é
relativamente simples: o mergulhador fala em um microfone ligado a um circuito eletrônico
que, com a ajuda de transdutor especial, converte a voz em um sinal de ultra-som.
Transmitido pela água em todas as direções, este sinal chega ao receptor que faz o
processo inverso e permite que o outro mergulhador ouça através de um fone especial à
prova dágua.
Mas o problema não acaba aí: para podermos falar necessitamos de uma cavidade com ar em frente à boca. Mergulhadores profissionais normalmente trabalham com capacetes ou máscaras full-face (que cobrem todo o rosto), equipamentos caros, pesados e inadequados para o mergulho amador. A solução veio com a adaptação dos equipamentos de comunicação a máscaras full-face leves (como as fabricadas pela Interspiro, Scubapro e Ocean Reef) e a invenção das "meias-máscaras", que substituem o bocal normal do regulador, cobrem apenas a boca e são mais simples e baratas que as full-face.
Hoje existem diversos
fabricantes de equipamentos de comunicação sem fio para uso com equipamento autônomo;
Ocean Technology Systems (OTS), Orcatron e DiveLink são os mais conhecidos. O Buddy
Phone da OTS é provavelmente o modelo mais popular e é comercializado também pela
Aqualung (US Divers).
Ao comprar um equipamento destes você pode optar entre uma máscara full-face ou uma meia-máscara. Além disto, todos os fabricantes oferecem também unidades de superfície (que podem ser instaladas em barcos para permitir que a equipe de superfície converse com os mergulhadores) e receptores simples (que não necessitam de máscaras especiais e permitem que, por exemplo, um instrutor oriente de forma unilateral diversos alunos simultaneamente).
A equipe da Tech Diving utiliza há mais de 2 anos um Buddy Phone,
normalmente com máscaras Interspiro. Ele é um equipamento simples, com apenas dois
componentes: o microfone à prova dágua instalado no interior da máscara e o
transmissor/receptor, que abriga toda a eletrônica, o transdutor de ultra-som e o fone de
ouvido e é fixado pela tira da máscara junto ao ouvido esquerdo. Uma bateria comum de 9V
alimenta o sistema e dura cerca de 8 horas de mergulho.
O receptor é ativado automaticamente quando molhado e, como nos walkie-talkies, você precisa apertar um botão (PTT ou push-to-talk) para falar. Não é possível transmitir e receber ao mesmo tempo.
Para evitar o incômodo do PTT, alguns equipamentos utilizam um recurso chamado "VOX", que detecta automaticamente a fala e aciona o modo de transmissão. Apesar de deixar as mãos livres para outras tarefas, o VOX também tem seus inconvenientes: o barulho da respiração pode ativar a transmissão e é preciso acostumar-se ao fato de que o início das frases é freqüentemente cortado.
Debaixo
dágua a comunicação depende de um pouco de prática. É preciso falar lentamente,
coordenando os ciclos de respiração e fala. Para facilitar a compreensão, é melhor
utilizar um vocabulário simples e padronizado. E nos primeiros mergulhos é preciso
alguma coordenação para os dois mergulhadores não tentarem falar simultaneamente -
neste caso, ninguém ouve ninguém e o bom e velho sinal de "câmbio" é uma boa
saída. Após alguns mergulhos, a comunicação se torna natural e a diversão é
garantida.
Logo no primeiro mergulho você descobre que o Mundo do Silêncio já não é tão silencioso assim... A excitação é grande e você passa o mergulho inteiro se divertindo com o novo "brinquedo". Com o tempo os diálogos se tornam mais curtos e objetivos e aí o equipamento mostra todo o seu valor.
Os fotógrafos podem dirigir com precisão os movimentos da modelo. Uma equipe em uma operação de busca e recuperação ganha eficiência (os mergulhadores podem conversar entre si e com a superfície, coordenando melhor os trabalhos). Divemasters e instrutores vêem sua comunicação com os alunos facilitada. E se a visibilidade estiver ruim e você não tiver o que fazer debaixo dágua, não se preocupe, pois o mergulho se transforma rapidamente em uma seção de piadas...
Antes de comprar um equipamento de comunicação é preciso estar atento a alguns
detalhes. Em primeiro lugar vem a escolha da máscara. As meias-máscaras não são muito
confortáveis e dificilmente se adaptam à pessoas com barba ou bigode. Já as máscaras full-face
não se adaptam a rostos muito pequenos e exigem treinamento especial.
No caso das full-face, para sua própria segurança não pense que é só ler o manual ou conversar por cinco minutos com o vendedor para se transformar em um especialista: é preciso treinamento. Se você não está convencido disto, responda rápido: como você faria uma troca de ar com seu companheiro utilizando uma full-face ?
Leve em
consideração também que existem situações em que a qualidade da comunicação pode
deixar a desejar. A propagação do ultra-som é afetada por fatores como presença de
objetos (como rochas e naufrágios), ruído ambiente (como ondas e motores) e até mesmo
por diferenças de salinidade e temperatura da água. Em um mergulho em mar aberto a
comunicação é quase perfeita e o alcance supera os 300 m, mas em um naufrágio ou
caverna pode ser impossível estabelecer qualquer tipo de diálogo.
Prepare-se também para um aumento do consumo de ar. Principalmente com as máscaras full-face, o consumo aumenta de 15% a 40%, dependendo de quanto você fala.
Por fim, equipamentos deste tipo são caros, em especial se você optar por uma máscara mais sofisticada. Nos EUA, um transmissor/receptor BuddyPhone custa cerca de US$ 350,00. Acompanhado de uma máscara Interspiro, seu preço sobe para mais de US$ 950,00. Como você precisa de pelo menos um par de Buddy Phones para fazer algo útil, um sistema destes pode custar mais que um equipamento de mergulho autônomo completo.
Apesar do preço salgado, os equipamentos de comunicação subaquática conquistam novos adeptos a cada dia e algumas operadoras (inclusive no Brasil) já possuem conjuntos para aluguel. Para evitar desapontamentos, vale a pena experimentar antes de comprar.
Quem sabe daqui a alguns anos não estaremos todos utilizando comunicações em nossos mergulhos ? Aí será realmente o adeus ao Mundo do Silêncio ... Câmbio final.
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