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BIBLIOTECA |
A introdução do SCUBA (Self-Contained Underwater Breathing Apparatus) durante a Segunda Guerra Mundial mudou o conceito de mergulho. Até esta data, as operações de mergulho utilizavam suprimento de ar a partir da superfície e o cálculo e controle da descompressão eram executados pela equipe de superfície. Com o advento do SCUBA vieram novos problemas de logística a serem enfrentados:
![]() | Mergulhadores sem contato direto com a superfície e, agora, responsáveis pela sua
própria descompressão. |
![]() | Mergulhadores não tinham mais um suprimento ilimitado de ar. Isto forçou o
desenvolvimento do conceito de mergulhos sucessivos. |
![]() | Mergulhadores agora tinham liberdade de estabelecer profundidades diferentes ao longo do
mergulho. |
Dispositivos Analógicos
Antes do advento dos microprocessadores, computadores analógicos, mecânicos e elétricos, foram utilizados para simular modelos descompressivos.
SOS Decompression Meter
DCIEM - Mark Series Em 1962, o Instituto Civil e Militar de Medicina Ambiental (Defense and Civil Institute of Environmental Medicine - DCIEM) do Canadá iniciou o desenvolvimento de uma série de computadores descompressivos analógicos pneumáticos, sob a direção de D.J. Kidd e R.A. Stubbs, os mesmos que desenvolveram o modelo no qual as tabelas do DCIEM são baseadas. O dispositivo tinha 4 compartimentos para simular a absorção/eliminação do nitrogênio pelo mergulhador. A tabela abaixo mostra os resultados obtidos com as várias versões deste aparelho.
Modelos de Computadores Descompressivos |
|||
Mark II P | Mark III P | Mark V S | |
Número de Mergulhos | 526 | 478 | 3775 |
Procentagem de DD | 5,0% | 1,5% | 0,6% |
O MARK VS foi produzido pela empresa Spar Aerospace no final da década de 60 para os mercados militar e comercial, com profundidade operacional de 60 metros. Nos anos 70 a empresa Spar desenvolveu um modelo menor e mais leve que podia ir até 90 metros. Devido à complexidade do aparelho e seus altos custos de fabricação, o MARK VS não era um produto comercialmente viável para o mergulho amador.
resultaram em produtos muito caros para o mergulho amador. Em 1975, a empresa Farallon Industries da Califórnia lançou um dispositivo chamado Decomputer. Este aparelho era um computador analógico pneumático que utilizava a tecnologia de membranas semipermeáveis. Tinha 4 membranas que simulavam 2 compartimentos:; 2 das membranas eram utilizadas para simular a absorção de nitrogênio e 2 eram utilizadas para simular a eliminação de nitrogênio. As membranas tinham tamanho variado para simular diferentes velocidadesde absorção e eliminação. O mostrador tinha 3 zonas codificadas em cores: verde, amarelo e vermelho. O mergulhador não poderia retornar à superfície enquanto o ponteiro estivesse na zona vermelha ou na parte da zona amarela próxima à zona vermelha.
Testes realizados no Instituto Scripps de Oceanografia indicaram que o Decomputer falhava em simular os limites descompressivos da tabela da US Navy. Resultados com testes em mergulhos sucessivos mostraram que o Decomputer era ainda menos adequado. A marinha da Austrália também avaliou o Decomputer e concluiu que ele produzia limites não-descompressivos muito liberais e que suas membranas apresentavam muita deterioração mecanica.
Primeiros Computadores Digitais
Na década de 70 a revolução dos microprocessadores possibilitou a construção de computadores digitais de tamanho reduzido dedicados à tarefa específica de cálculo descompressivo. Computadores digitais são mais precisos que computadores analógicos mecanicos e apresentam menos problemas de calibragem. Naquela época no entanto, o principal problema destes computadores digitais era a falta de uma fonte de energia apropriada.
O primeiro computador digital do DCIEM, chamado XDC-1, era um modelo de mesa. Era utilizado para analisar ou planejar perfis de mergulhos. O usuário fornecia os dados do perfil de mergulho através de um teclado. Também podia ser utilizado em "tempo real" caso a profundidade do mergulhador fosse fornecida através de um sensor de pressão e um conversor Analógico/Digital. O "status" descompressivo era determinado através do cálculo do nitrogênio acumulado nos quatro compartimentos do modelo de Kidd-Stubbs.
Durante o mergulho, o operador poderia extrapolar o perfil de mergulho e determinar a descompressão necessária baseado em várias opções. O computador XDC-1 foi fabricado pela empresa canadense Canadian Thin Films Systems Inc e foi utilizado com sucesso em instalações de camaras hiperbáricas. No entanto, seu projeto não era prático para situações de mergulhos em águas abertas.
Para enfrentar os rigores de uma operação de mergulho real, o DCIEM projetou o XDC-2. Este computador era um modelo apropriado para operações de mergulho com suprimento de ar da superfície. A unidade podia ser conectada a um sensor de pressão que era acoplado ao traje do mergulhador. O modelo descompressivo básico utilizado era o mesmo modelo Kidd-Stubbs utilizado no XDC-1. O mostrador do XDC-2 era constituido de 4 "displays" de LEDs e vários indicadores. As principais informações apresentadas no mostrador eram:
![]() | Profundidade |
![]() | Tempo de Fundo |
![]() | Profundidade Segura - profundidade para a qual o mergulhador poderia ascender sem violar
o modelo. |
![]() | Tempo não-descompressivo/Tempo total de Subida - quando o mergulhador estava dentro dos
limites não descompressivos este "display" apresentava o tempo
não-descompressivo (número negativo). Se o mergulhador entra em descompressão este
"display" apresentava o tempo total de descompressão, incluindo o tempo de
subida. |
Para atender os mergulhadores SCUBA, o DCIEM desenvolveu o modelo XDC-3, também conhecido como Cyberdiver. O modelo XDC-3 foi o primeiro computador descompressivo, baseado em microprocessadores, que podia ser carregado para baixo dágua junto com o mergulhador. Era constituido de uma caixa, que continha toda a parte eletrônica, e um mostrador, que era conectado a esta caixa por um tubo longo onde as conexões elétricas eram acomodadas. As informações apresentadas eram idênticas às apresentadas pelo XDC-2. A unidade era alimentada por 4 baterias de 9V, que duravam em torno de 4 horas. Para conservar energia, os "displays" de LEDs eram equipados com um interruptor que permitia ativá-los por 6 segundos para leitura das informações. O modelo XDC-3 teve um sucesso modesto, devido ao seu preço e ao custo de 4 baterias de 9V a cada 4 horas.
A Dacor Corporation iniciou seu primeiro projeto de computador descompressivo no final da década de 70. Devido a motivos legais, eles decidiram projetar um computador que simplesmente fornecia ao mergulhador as informações das tabelas de mergulho da US Navy para o mergulho sendo executado. A Dacor estava preparada para lançar no mercado este modelo, mas o consumo de energia era muito elevado e exigia uma bateria especial para garantir utilização contínua por um mínimo de 12 horas. De acordo com a companhia, existiam 2.000 unidades do modelo prontas para comercialização, mas a fábrica das baterias especiais foi destruida num incêncio e o projeto foi engavetado.
A empresa Kybertec, que tinha trabalhado no desenvolvimento do modelo XDC-3, ou Cyberdiver, entrou no mercado do mergulho recreativo com o modelo Cyberdiver II em 1980. Assim como o modelo não-lançado da Dacor, este modelo lia as tabelas da US Navy. Ele era conectado ao cilindro de mergulho e também fornecia a pressão do cilindro. Ou seja, já existia um computador integrado ao consumo de ar em 1980! Utilizava uma bateria de 9V que lhe dava uma autonomia entre 9 e 12 horas. A unidade possuia um alarme audível para situações de descompressão. O modelo Cyberdiver II teve algum sucesso, mas era muito grande e seu método de calibragem era muito complexo.
A empresa Newtec (novo nome para a Kybertec) lança o Cyberdiver III em 1981. Agora, ao invés de usar tabelas da US Navy, este modelo calcula o "status" descompressivo através do modelo de Kidd-Stubbs. O mostrador gráfico utilizava 5 LEDs para indicar a profundidade segura e a velocidade de subida segura. Assim como o Cyberdiver II, o Cyberdiver III se conectava à porta de alta pressão do regulador e o tamanho dos dois modelos era quase idêntico. Este modelo estava disponível até o início dos anos 90!
Decobrain I
O
Um aspecto único do Decobrain I era o fato de, apesar de ser baseado em tabelas de mergulho, permitir mergulhos multi-nível. O computador do Decobrain I realizava cálculos multi-nível utilizando os grupos de mergulhos sucessivos das tabelas. O problema com este método é que estes cálculos só levavam em conta um único compartimento do modelo das tabelas suiças: o modelo cujo meio-tempo era de 80 minutos.
Em 1985, a Divetronic liberou uma nova versão de software para o Decobrain I, não mais utilizando tabelas mas sim o modelo descompressivo desenvolvido na Suiça. Este "upgrade" de software o transformava no Decobrain II.
EDGE
O outro modelo de computador descompressivo anunciado em
1983 foi o EDGE, da empresa ORCA Industries Inc. Este foi sem dúvida o primeiro
computador descompressivo de grande sucesso e ampla aceitação de mercado. Sua
construção robusta, seu tamanho reduzido (para a época) e seu "display"
gráfico revolucionaram o mercado do mergulho e tornaram realidade a utilização do
computador descompressivo pelo mergulho recreativo.
O EDGE utiliza um algoritmo modificado de Haldane similar ao utilizado para a produção das tabelas a ar da US Navy. Isto permitia aos mergulhadores um ponto de referência para verificar os resultados produzidos pelo EDGE, auxiliando na compreensão na operação apropriada do aparelho. Seu "display", constituido de uma matriz de cristal líquido de 32 x 40 "pixels" permitia a apresentação dos resultados tanto em formato numérico como em formato gráfico. Sua caixa robusta tornavam-no um modelo praticamente indestrutível.
Em 1987 a empresa Orca desenvolveu o modelo SkinnyDipper, outro marco no desenvolvimento de computadores de mergulho. Este modelo era mais fácil de usar e mais acessível que seu predecessor, o modelo Edge. A diferença principal entre eles é que o Edge era capaz de apresentar informações completas para uma possível descompressão.
A Suunto lançou 2 modelos em 1987: os modelos Suunto SME-ML e o Suunto SME-USN. O modelo ML era um modelo multi-nível enquanto que o modelo USN era um modelo que utilizava as tabelas da marinha americana para o cálculo da descompressão. Foram os primeiros computadores a permitir que o usuário recuperasse as informações dos perfís dos mergulhos executados. A Oceanic introduziu o modelo DataMaster II (equivalente ao modelo DataScan II, da US Divers), os primeiros modelos que possuiam também um manômetro integrado. Também em 1987 a empresa Uwatec introduziu o modelo Aladin que se tornou muito popular devido ao seu preço final acessível.
O ano de 1988 marca a introdução do modelo MicroBrain da
Dacor, sendo o computador com menor peso e tamanho disponível na época. Além disso, foi
o primeiro modelo a permitir que o usuário reinicializasse o computador ao final do
mergulho através de um imã que apagava os dados de mergulhos prévios armazenados.
O ano de 1989 marca a introdução da nova geração de vários modelos introduzidos anteriormente, com melhorias nos algoritmos empregados. O final do ano marca a introdução do primeiro computador a apresentar cálculos integrados de descompressão e consumo de ar: o modelo Delphi da Orca. Também foi o primeiro modelo a permitir a descarga das informações do perfil de mergulho para um computador do tipo PC.
Modelos da década de 90
A década de 90 marcou a popularização do computador de mergulho, com dezenas de modelos de todos os tamanhos, características e preços disponíveis para o mercado do mergulho.
O ano de 1993 marca o lançamento do primeiro modelo a fazer uso da
tecnologia de "wireless" para separar o computador em duas unidades funcionais:
o sensor de pressão do cilindro da unidade de pulso com o mostrador do computador. O
pioneiro nesta técnica foi o modelo Nemesis da Cochran. Em 1994 a Uwatec reage e lança o
modelo Aladin Aix X.
O ano de 1994 é marcado por mais inovações: surge o primeiro
computador a suportar misturas Nitrox (o modelo Bridge da DiveRite) e o primeiro
computador "falante" (os modelos DiveTalker da Steelex e DiveMate da Mares).
Hoje, com a popularização dos computadores que suportam tanto Ar como Nitrox, temos disponíveis mais de 40 modelos diferentes de computadores de mergulho.
A necessidade de utilizar um dispositivo automático para o cálculo dos parametros de mergulho vem desde a introdução do equipamento de mergulho autônomo. O sucesso do EDGE no mercado do mergulho recreativo marcou o início da crescente utilização destes tipos de computadores. Em 1987 já haviam 8 computadores de mergulho diferentes no mercado, e a evolução e diversidade não pararam desde então.
Bibliografia
Microprocessor Applications to Multi-Level Air Decompression Problems Karl E. Huggins Michigan Sea Grant College Program
Dive Computers A consumers guide to history, theory & performance Ken Loyst Watersport Books
Internet Dive Computer Review Kevin O. Grover - http://www.unlv.edu/SCUBA/idcr/index.html
Autor
Maurício Henriques é Instructor Trainer PDIC, Instrutor IANTD para todas as modalidades de mergulho técnico até Trimix. É mergulhador "full cave" pela NSS-CDS e pela NACD. É formado em Engenharia de Eletricidade e seu maior interesse no mergulho são as técnicas de mergulho e as teorias e modelos que tentam explicar o fenomeno descompressivo no mergulhador.